sábado, 13 de fevereiro de 2010

LÁGRIMAS EM VEZ DE SANGUE

LÁGRIMAS EM VEZ DE SANGUE

(O ambulante judeu, Baruch Charmam, chorou por não poder doar sangue a Israel?).

Noite cinzenta. A chuva, enervante e miúda,
Punha n'alma da terra, esfolhada e desnuda,
A imensa gelidez de uma desilusão,
Dessas que a gente sente e não sabe a razão...

De pé, sob o beiral de uma casa de pasto,
Achava-se um judeu, velho, cansado e gasto,
Que passara o seu dia em grande atividade,
Gritando o seu pregão nas ruas da cidade...
E ali, a contemplar o trânsito noturno.
Lembrou-se do seu povo e ficou taciturno...
Tanto tempo sem pátria!...

E agora que fundara
O Estado de Israel, a guerra começara
Terrível, desigual, como a querer de novo,
Na mais torpe injustiça - exterminar seu povo.

Nisto, passa um garoto a correr e a gritar:
- Os judeus do Brasil acabam de criar
O seu Banco de Sangue!?

E ele que, intimamente,
Vivia o drama cruel de tôda a sua gente,
Perseguida e humilhada em todos os lugares,
Teve, nesse momento, a antevisão dos lares
Livres, em terra livre, onde a família em prece,
A proteção de DEUS outra vez agradece...

Velho, cansado e triste o ambulante semita,
Na história milenar de seu povo medita:

- A saída do Egito, a passagem triunfal.
Do Mar Vermelho, e a rocha aberta em manancial
De água pura, e o maná que chovia do céu,
E a nuvem que era luz e de dia era véu,
E o profeta Moisés, e o Decálogo, e as glórias
E os juízes, e o reino, e as soberbas vitórias...
Mas...também toda a luta e peregrinação
Até à derrocada, à morte e à escravidão,
Na longa e singular caminhada da vida,
Na eterna aspiração da Terra Prometida!

- Tão velho!.... Mesmo assim, com quase setenta anos,
corpo cheio de dor, alma cheia de enganos,
Sentiu nascer no peito o desejo veemente
E a vontade febril de ajudar sua gente
A restaurar, com toda a sua ostentação,
O reino de Saul, David e Salomão.

Que pena ter perdido a sua juventude!
Pois poderia, então ter a grande virtude
De a pátria defender, filiado à Haganá,
em nome da justiça e em nome de Jeová.

O dia amanhaceu, radiante de esperança;
E o ambulante judeu, que a própria vida cansa,
Chorando de seu povo a desdita cruel,
Seguiu para doar seu sangue a Israel...

Chegara a sua vez. Vibrante de emoção,
Acercou-se, feliz, da mesa de inscrição;
A enfermeira apanhou a ficha-identidade:
- "Seu nome, faz favor?"-
-Baruch Charmam
- Idade? - Sessenta e cinco! -

E, ali, recordou quanto andara
Para encontrar a pátria, a pátria que sonhara,
Livre, forte e feliz....

Mas ele escuta, exangüe:

- Não podemos, senhor, aceitar o seu sange-
- Senhorita (ele diz a chorar e a tremer),
Não tenho nada mais que possa oferecer
Ao meu povo! Estou velho e vivo solítário!
De que me serve a vida ao fim do itinerário?!...
Aceite por favor, aceite por piedade
Meu sangue para o bem da heróica mocidade
Que, em luta desigual, se bate e se agiganta
Por ver livre raiar o sol na Terra Santa!
Aceite-o por favor! para isto é que ainda vivo!...
E prostrou-se a chorar, num pranto convulsivo.

Chora Baruch Chamam! Corra livre o teu pranto!
Teu sangue não irá, tuas lágrimas, no entanto,
Com outras subirão ao trono do Senhor
P'ra descerem, depois, em lenitivo à dor
Dos que lutam com fé em prol da Liberdade,
Por um mundo melhor, firmado na Verdade,
Onde presida o Amor, onde impere o Respeito
Ao livre pensamento e à força do Direito!
Chora Baruch Chamam! que as lágrimas caídas
Sirvam para curar as profundas feridas
Dos que lutam por ver uma nova Betel,
Na sólida união do Estado de Israel!

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